Por: António Mendes | PGD D. 1960 | 2015-2015 | RC de Almada
Dar de Si, Pensando em Si
Em julho de 1922, Ben Franck Collins, do Rotary Club de Chicago apresentou o lema “Dar de Si antes de pensar em Si” que foi aceite e se mantem como lema principal do Rotary.
Trata-se duma mensagem primeiro discutida informalmente num grupo de Companheiros Rotários e logo apoiada por Paul Harris, que estava presente, e foi apresentada como mensagem na Convenção de Rotary International em 1922, em Los Angeles, na Califórnia, USA. Outros Rotários já tinham refletido sobre o tema que contém a filosofia essencial do Rotary desde a sua fundação em 1905, como Arthur Frederic Sheldon, também do Rotary Club de Chicago e até, de forma simples, Jonathan Siqueira numa síntese breve “ECO”, o retorno recebido por quem serve o próximo: “ o mais beneficiado é aquele que serve bem o outro”.
No âmbito desta reflexão, com uma prática exemplar, podemos evocar, por exemplo, Mahatma Gandhi, Sta. Madre Teresa de Calcutá e São francisco de Assis: “é dando que se recebe”, ou mesmo Baden-Powell, fundador do escutismo internacional, “a melhor maneira de ser feliz é contribuir para a felicidade dos outros”.
Passado um século sobre a divulgação do lema criado por Franck Collins, ouso deixar aqui o meu pensamento sobre o tema, fruto do estudo e reflexão que me habituei a fazer hámuito na minha meditação quotidiana.
Na minha formação científica nos domínios da Psicologia e da Sociologia feita ao longo de muitos anos, aprendi que o caminho para a maturidade começa com aprender a gostar de mim para depois gostar dos outros e depois gostar da vida. Esta é a senda natural para o nosso crescimento. O inverso, como às vezes é sugerido, não resulta.
Em alguns povos do interior da África e da Amazónia por nós muitas vezes percecionados como atrasados mas que,
em muitos aspetos nos surpreendem pela sua sabedoria, encontramos conceitos sobre os quais vale a pena refletir. É o caso do “ubuntu” que surpreendeu o antropólogo europeu que tendo desafiado um grupo de crianças e jovens da tribo llosa, na África do Sul a correrem no terreiro da aldeia para que quem chegasse primeiro ganhasse um cesto de frutos que muito apreciavam, viu aquelas crianças darem as mãos e sorridentes chegarem ao cesto e dividirem as frutas equitativamente entre eles em vez de procurarem ser mais rápidos e ficar um com o prémio só para para si. Este comportamento que surpreendeu o antropólogo levou-o a perguntar-lhes porquê? E a resposta de um dos jovens foi uma grande lição:” se eu ganhasse sozinho ficava feliz e os outros tristes; eu não posso ser feliz sozinho. A expressão “sawbona”: eu te respeito, eu te valorizo, tu és importante para mim” tem uma resposta “shikoba”: então eu existo para ti.
E entre nós, Frei Fernando Ventura escreveu sobre a “aritmética de Deus” dizendo que “para multiplicar é preciso dividir” e para “somar é preciso subtrair sem tirar nada a ninguém”, Também Ortega y Gasset em “Meditaciones del Quijote”escreveu: “yo soy yo y mi circunstancia, y si no la salvo a ella no me salvo yo”. Portanto “ eu sou eu e a minha circunstância e se não a salvo a ela não me salvo eu”, entendendo-se “circunstância” pela nossa envolvente, o outro ser humano, o nosso semelhante. Com o mesmo sentido temos também a afirmação bíblica “Benefac loc illi quo natus es”.
Porque ninguém é feliz sozinho, porque ajudando os outros me estou a ajudar a mim próprio, talvez “dar de si, pensando em si” seja mais correto. O lema centenário “dar de si antes de pensar em si“ é um lema, segundo penso, que representa um desprendimento total de nós próprios só ao alcance de seres excecionais como uma Sta. Madre Teresa de Calcutá e poucos mais.
Para nós, talvez seja mais motivador porque mais realista e ao nosso alcance, propor o ideal “dar de si, pensando em si”.