Por Maria João Melo Gomes | RC Parede–Carcavelos
Pedro nasceu nos Açores, mas tem apenas memórias difusas do oceano e da mãe que faleceu demasiado cedo.
O pai, com problemas de saúde mental, alcoolismo e dificuldade em lidar com a perda e a integração, pois nasceu num PALOP, veio para o continente e nunca mais regressou às ilhas. Aproxima–se o Natal e o projeto “Natal lrmanado” proporciona a jovens que cresceram em instituições um reencontro com algum familiar.
O Sistema de Promoção e Proteção entendeu que o melhor para o Pedro, por falta de alternativas na família alargada, seria ser acolhido numa Instituição. As regras rígidas, os castigos corporais, a falta de respeito pela individualidade, foi a realidade em que cresceu. Sempre que podia, o Pedro fugia “nunca fui pássaro de gaiola” – o Ser Humano, quando saudável, foge do que o oprime – mas a criança era encontrada e voltava para a realidade da qual queria fugir.
A pré-adolescência chegou, mas a revolta e vontade de viver fora dali estavam sempre presentes. O Sistema entendeu que outra instituição faria melhor, e na terceira tentativa a adaptação às regras, a falta da família e do pai – único elemento que conhecia e que aprendera a ter como modelo e a quem amava de forma incondicional, aconteceu a última fuga aos 17 anos. “Nunca mais me apanharam”. Uma família de etnia cigana permitiu que trabalhasse nas vendas ambulantes com eles, em troca de alguma comida e um canto onde podia pernoitar. O tráfico de droga, os furtos e outras ilegalidades cruzaram–se na sua vida e não tardou a ter problemas com a justiça.
Um dia, uma reportagem na televisão sobre a única entidade que em Portugal se dedica ao apoio de jovens que viveram em instituições, permitiu que pedisse ajuda. A PAJE e os seus voluntários combatem a solidão, dão suporte a tomadas de decisão, são apoio de retaguarda nos momentos menos bons. Os problemas de saúde eram muitos e um internamento numa unidade psiquiátrica foi o primeiro passo. A PAJE financiou o internamento de longa duração numa comunidade terapêutica e depois de recuperado emocionalmente pelo nosso psicólogo, encontrou emprego.
Quando tudo parecia encaminhado, uma pancreatite necrosante levou-o de novo ao hospital e a lutar pela vida, mas a batalha parece vencida. Os Voluntários da PAJE são hoje cuidadores informais, com foco na alimentação cuidada, no apoio psicológico e a esperança constante da presença física (o voluntariado tem limites o Pedro vive a cerca de 50 Km).
Aproxima–se o Natal e o projeto “Natal lrmanado”, que proporciona a jovens que cresceram em instituições um reencontro com algum familiar, está em contacto com uma tia para incluir o Pedro. Conciliar esta época especial e estar com a família pode fazer a diferença no futuro do Pedro, que hoje tem 29 anos.
Prometemos continuar a trabalhar para que os “ex–acolhidos” tenham justiça social, para que o seu passado não condicione o seu futuro e continuem a brindar-nos com trajetórias de superação e resiliência, verdadeiramente inspiradoras.