ANTÓNIO MENDES
Past-Governador Distrito 1960 (2014-2015)
Comissão Distrital dos Serviços para uma Cultura de Paz
- A Paz constitui, atualmente, um campo motivador de investigação científica na área das ciências sociais. Os investigadores procuram identificar os mecanismos fundamentais produtores de violências para, assim, encontrarem as melhores estratégias para a construção da paz. É neste campo da peace research que desenvolvo a minha investigação-ação.
- Quando refiro “violências” como inibidores da paz, uso o termo no plural porque realmente não há uma, mas várias violências: a violência na família, na escola, nas organizações, na sociedade, no mundo. Basta consultarmos diariamente os mass media para termos uma perceção, ainda que sucinta, dessas violências.
- A violência tem diversas origens, é multifacetada, podendo existir dentro da própria paz e no modus operandi da sua construção.
Impõe-se, pois, uma análise sociológica, psicológica, biológica da violência como meio de encontrarmos antídotos que permitam a sua redução.
- Contra a violência da guerra, do terrorismo, da criminalidade vulgar, ergue-se hoje a barreira da “segurança”. Mas “segurança” o que é?
Os políticos, os governantes, com uma visão estatocêntrica da segurança têm vindo muitas vezes a construir um poder autocrático sobre as pessoas, sobre os cidadãos indefesos e a desenvolver sistemas de defesa político-militar das fronteiras dos seus países, olvidando as transformações políticas, económicas e sociais mais adequadas.
- As dinâmicas conflituais internacionais e intranacionais têm que ser objeto de estudo envolvendo políticos, líderes de opinião, movimentos sociais, educadores em geral.
O Homem nasce humano, mas não nasce humanizado. Há que humanizar o Homem. É preciso estudar os conflitos, aprender a geri-los, dando a primazia à paz sobre a violência.
O conflito é uma realidade. Só não há conflitos nos cemitérios. O conflito pode até ser positivo como gerador de energias. Há que educar para a paz, aprendendo a gerir os conflitos.
Há muitas violências. Para cada uma há a sua paz. O diálogo interdisciplinar é um instrumento para a construção da paz.
- A consolidação da paz não é fácil. É, ainda, um terreno minado, um processo cheio de ambiguidades. As lutas anti-colonialismos, os movimentos independentistas emergentes e cheios de pujança no último século, por exemplo, conduziram muitas vezes não à construção das democracias sonhadas, mas à substituição de velhos sistemas autocráticos por novos sistemas autocráticos e déspotas arrastando para a guerra, a miséria e o sofrimento aqueles povos que diziam querer libertar e tornar felizes.
- Estabelecer o primado da negociação e da diplomacia contra o conflito é, deve ser, a tarefa urgente de todos os Homens de boa vontade, sobretudo dos que assumem responsabilidades importantes na Governação dos povos, na direção dos Grupos religiosos e outros.
O diálogo inter-religioso é uma urgência, uma fonte de paz. Como escreveu Hans Kϋng em “O Islão – História, Presente, Futuro”: Não haverá paz entre as religiões sem o diálogo entre as religiões.
Também a Religião Cristã Católica, no Concílio Vaticano II e em diversos documentos publicados pelos últimos Papas tem apelado ao diálogo inter-religiosos como um compromisso que é necessário assumir em nome da Paz Mundial, de que destaco “Diálogo e Missão” (1984) e “Diálogo e Anúncio” (1991). Deste último, evoco a passagem seguinte: “O diálogo sincero supõe aceitar reciprocamente a existência das diferenças, ou também das contradições, e respeitar a livre decisão que as pessoas tomam em conformidade com a própria consciência”.
- Também fora das religiões há “vozes que clamam no deserto”. Recordo aqui, pela sua dimensão e impacto, alguns grandes vultos do nosso tempo:
– JOHN LENNON, que nasceu em Liverpool, na noite de 9 de outubro de 1940, quando a Alemanha nazi estava a bombardear a cidade. Anos mais tarde integrou a banda “The Beatles” com Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr e, nos anos sessenta do século passado, passou ao mundo uma mensagem de paz com a sua música genial de que destaco Give Peace a Chance (dê uma oportunidade à paz).
– MAHATMA GANDHI, nascido na Índia em 2 de outubro de 1869, combateu a guerra através do diálogo tendo conseguido a independência do seu país e evitado o ataque do exército inglês.
– MARTIN LUTHER KING, líder negro pacifista e pastor americano, nascido em 1929, em Atlanta, na Geórgia, U.S.A. Passou toda a sua vida a lutar pela realização do seu sonho de paz, de amor e de fraternidade contra o racismo e a injustiça social. Foi prémio Nobel da Paz em 1968.
– DALAI LAMA, líder espiritual tibetano nascido em 1935.É a autoridade máxima do budismo tibetano. Prémio Nobel da Paz em 1989 em reconhecimento da sua campanha pacifista para acabar com a dominação chinesa no Tibete.
- Essas vozes e muitas outras, a maioria certamente de gente anónima que vive quotidianamente semeando amor na família, na escola, na sociedade propõem-nos desafios para a construção da paz:
– Os meios de comunicação social têm que deixar de ser alimentadores dos conflitos, fomentadores de uma cultura de guerra e tornarem-se agentes de paz.
– É necessário reforçar os poderes reguladores das instâncias internacionais multilaterais consagradas na Carta das Nações Unidas.
– Os mais frágeis, as minorias, os povos, as autoridades comunitárias e tradicionais têm que ser envolvidas na construção da paz.
– A paz tem que ser construída e alicerçada no respeito pelas culturas, pelas tradições e singularidades das pessoas envolvidas.
– As escolas de todos os níveis e os centros de investigação têm que debruçar-se profundamente no estudo e na divulgação das respostas mais adequadas à prevenção e gestão de conflitos, fomentando uma cultura de paz.
- Em 1993, em Londres, foi publicado um importante documento: A GLOBAL ETHIC. THE DECLARATION OF THE PARLIAMENT OF THE WORLD’S RELIGIONS de que destaco três parágrafos, como súmula do que atrás disse:
1 – Não haverá sobrevivência da humanidade sem PAZ MUNDIAL.
2 – É necessário que as crianças e jovens sejam educados na família e na escola, para uma cultura de não-violência.
3 – Cada povo, cada raça, cada religião tem em relação aos outros um dever de tolerância, respeito e inclusive de profunda estima.
Também Gregg Braden, após vinte anos de pesquisa, publicou em 2006 um livro “Código de Deus”, em que afirma que a paz é possível nas famílias e entre as nações. Na sua investigação diz ter descoberto que existe uma mensagem codificada no ADN de todas as nossas células que tem o nome Deus, independentemente da raça, do credo ou de qualquer outra diferença.
Comparando os elementos de vida (hidrogénio, nitrogénio, oxigénio e carbono) e seus equivalentes nos alfabetos hebraico e árabe, apesar das línguas serem diferentes, os códigos numéricos subjacentes são os mesmos e produzem a mesma mensagem. A confirmar-se pela comunidade científica, seria mais uma prova da estupidez da guerra entre seres humanos.
- ROTARY: PRODUTOR MUNDIAL DA PAZ
Rotary é um grupo humano de profissionais e, como tal, associado ao inacabamento do Homem. Nasceu (1905) ao tempo da “Organização Científica do Trabalho” que Taylor, nos Estados Unidos e Fayol, em França, lideraram no início do século XX.
Paul Harris, principal fundador e dinamizador do Rotary, juntamente com os seus três companheiros co-fundadores, cedo se apercebeu de que o desenvolvimento económico e financeiro da revolução industrial, então em curso, precisaria de um investimento paralelo na vertente social para que o crescimento empreendido fosse sustentável. Foram precisos alguns anos para que empresários, gestores e trabalhadores entendessem essa verdade.
Rotary antecipou-se às conclusões dos cientistas sociais, dos investigadores, e alguns anos antes pela mão dos seus fundadores e dos que posteriormente receberam e acarinharam o seu testemunho, apostou na inteligência e na vontade dos homens que, constituídos em “Rotary Clubs”, primeiro nos Estados Unidos da América e, depois, pouco a pouco, pelo mundo inteiro, procuraram desenvolver sinergias em prol da construção de uma sociedade mais humana e mais fraterna, investindo na solidariedade e no apoio aos mais necessitados, fomentando uma cultura de paz.
Ultrapassando todas as fronteiras: físicas, políticas, religiosas, tudo o que artificialmente nos divide, o Rotary foi crescendo em rede pelo mundo inteiro conforme a perspetiva de Manuel Castells (a sociedade em rede) em que o aumento do número de nós (os clubes rotários) possibilita cada vez mais a materialização do sonho de Teillard de Chardin: a criação duma noosfera, uma esfera de inteligência que há-de envolver o nosso planeta; e também a visão do grande homem da comunicação, McLuhan: o mundo tornado uma aldeia global.
Desenvolvendo projetos nas áreas da saúde, da fome, da água, da alfabetização e literacia, Rotary converteu-se no maior clube de serviços do mundo atual.
Quando foi criada a Organização das Nações Unidas, estiveram presentes, na qualidade de delegados, peritos ou consultores, 49 rotários e, das 50 nações presentes, 33 tinham nas suas representações vários rotários.
Na primeira Assembleia Geral das Nações Unidas, em Londres, Rotary foi convidado a tomar parte nos seus trabalhos. Só três organizações têm assento na Assembleia Internacional das Nações Unidas além dos vários países que a constituem e são a Cruz Vermelha Internacional, O Vaticano e o Rotary Internacional.
O projeto Polio Plus que luta pela erradicação da poliomielite em todo o mundo é bem a expressão da sua contribuição para a felicidade humana. O objetivo último dos serviços que o Rotary presta é a paz e a compreensão mundial. A participação de rotários na formação e desenvolvimento das Nações Unidas, especificamente da UNESCO e da Declaração Universal dos Direitos do Homem, mostram o interesse do movimento rotário na construção de um mundo melhor, onde a paz, o amor, a solidariedade, consigam vencer os senhores da guerra.
A organização das bolsas para a formação superior de especialistas na área social, económica e política da construção da paz mundial são mais um investimento grande na conquista daquele objetivo. Todos os anos Rotary concede 110 bolsas pela Paz Mundial (60 mestrados e 50 certificados de especialização) através de concurso mundial em parceria com importantes universidades de vários países.
Ser rotário é ser gente que gosta de gente. De toda a gente!