Por Isabel Sequeira
Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta
Se estes não são os melhores tempos para se ser jovem, em 2019… talvez.
Dois anos volvidos, esta frase parece irónica e descontextualizada. Na contemporaneidade, são tempos desafiadores e complexos: pandemia, guerra, distância física, compromisso da saúde mental.
Contudo, o adolescente acaba por encontrar caminhos por entre as brechas da realidade. O adolescente será sempre um sonhador, um criador de cenários e um construtor de realidades alternativas.
Assim é a definição do estado adolescente: crescer e desenvolver.
É muitas vezes o olhar velho do adulto que transmuta o ideal adolescente. O peso da escola, das notas e, sobretudo, das expetativas dos pais, é o que cria o conflito interno e transforma sonho e projeto, em frustração e dor. Apenas em dor, quando o caminho fica mais escuro e intransponível.
A adolescência é o lugar da infância revisitada, agora com novas roupas e novos companheiros. Uma infância sem vínculo seguro será uma adolescência sem vínculo seguro. Pensarmos a vivência adolescente desprendida e desligada dos caminhos da infância, será como imaginar uma árvore sem raízes.
São tempo mais frios estes que vivemos. A pandemia que criou um fosso nas vivências adolescentes. Estes dois anos suspensos em distância, em doença e perda. Mas a esperança no adolescente criativo, sempre lá. Novas formas de contato. Mas sempre com a esperança no estar mais perto. No toque. E as festas voltaram. O namoro voltou. Só não voltou, quem não iria sair. Quem já estava preso nos nós cegos da infância negligente.
O caminho do jovem de hoje tem sempre uma mão-dada no medo. De falhar. De não ser bom o suficiente. Bom para os pais. Bom para a escola. Para o melhor trabalho.
Os desafios são agora para os adultos.
Quem somos nós, os adultos, se não quem também já foi adolescente. Porém, é a nossa própria visão toldada pelas nossas próprias angústias, que projetamos nos nossos adolescentes. Um adulto completo e satisfeito dá espaço, fornece pistas. Não condiciona nem empurra. O adolescente de hoje continua a ser audaz, reflexivo e criativo. Com menos espaço para Ser nos interstícios dos dias.
Mas a essência continua lá. Na busca de ligação e alternativas. O medo não está nos jovens. O medo está nos adultos. Ser adolescente, hoje, continua a ser a busca de sentido, de ligação e de afeto. Como sempre foi e sempre será.
Os tempos mudam, o mundo avança. O adolescente estará sempre no lugar do desenvolvimento e do crescimento. Só quando adoece é que não.
A adolescência é, assim, o lugar do “tornar-se”, o lugar da autonomia, momento de crise existencial, de descoberta e até disruptivo. É uma passagem da infância para a vida adulta, que deixa marca e cria marca.
Se a adolescência é a transição, que seja feita de experiências vividas e afetivas, mesmo que frustrantes e até tristes. Crescer tem destas coisas. Caminhar sozinhos custa mas depois percebemos que estamos sempre juntos por dentro.