Revista Portugal Rotário (RPR): Como entrou o Rotary na sua vida?
Ernesto Rodrigues: Estávamos em 1979. Ainda não era rotário. Convidaram-me para ajudar a formar um clube em Felgueiras. O meu conhecimento de Rotary era superficial e vinha apenas através de companheiros dos clubes de Fafe e de Amarante. Aceitei o desafio e, com a liderança de companheiros mais antigos, preparamos tudo durante o ano de 1979 e, em 1980, recebemos a carta constitucional do Rotary Club de Felgueiras. O Rotary Club de Fafe foi o padrinho e o Rotary Club de Amarante a ‘madrinha’. Foi há 37 anos.
RPR: Era jovem na altura.
Ernesto Rodrigues: Certamente. Em 1979, tinha 28 anos.
RPR: Foi fundador de um clube com a mesma idade que hoje se é membro de um clube Rotaract?
Ernesto Rodrigues: É verdade. Grande parte dos companheiros que, nessa altura, aderiram ao Movimento estavam dentro desse escalão etário. Jovens, entre os vinte cinco e os trinta anos. Teríamos depois os restantes companheiros com, com mais idade.
RPR: Um clube muito jovem. Alguns dos fundadores ainda estão ativos?
Ernesto Rodrigues: Sim estamos três no ativo, a saber o companheiro Manuel Freitas, o companheiro Pedro Sousa e eu próprio. Tenho 66 anos. Foi assim que entrei para Rotary, sabendo de antemão que esse Movimento era composto por clubes serviço, algo que já fazia em Coimbra.
RPR: Quando frequentava a Faculdade de Direito?
Ernesto Rodrigues: Eu pertencia a uma organização, em Coimbra, que se chamava “ Equipa de Acção Social. A preocupação que nós tínhamos centrava-se na parte interventiva, sobretudo nos bairros problemáticos da cidade. Nessa circunstância lembro-me dos bairros problemáticos da cidade: o Bairro da Conchada, o Bairro do Brinca e o Bairro da Pedrulha. O mais problemático era o da Conchada – bairro de lata mesmo -, onde intervínhamos.
RPR: Já nessa altura, com cerca de 20 anos, desenvolvia atividades de serviço.
Ernesto Rodrigues: Exatamente, com 19 e 20 anos.
RPR: Depois da Universidade mudou-se para Felgueiras onde começou a ensinar e a exercer a advocacia?
Ernesto Rodrigues: Sim, mudei-me para Felgueiras porque a minha mulher [Maria de Fátima Sampaio] é natural de Varziela – Felgueiras. Nasceu nesta casa. Conhecemo-nos em Coimbra. A minha mulher também estudava na Faculdade de Farmácia. Depois disso vim para aqui e foi aqui que comecei a minha atividade profissional como advogado. Ainda fui professor, porque para além do curso de Direito tenho também equiparação ao curso de Filologia Clássica. Fui professor durante dez anos, primeiro na Escola de Lousada e, depois, na Escola Secundária de Felgueiras. Procurava os horários noturnos, para poder trabalhar como advogado durante o dia. Só que depois não pude conciliar as duas coisas. Mas gostei muito de, durante algum tempo, ser professor.
Casamo-nos em 1974, tinha vinte e poucos anos e acabada a licenciatura. Viemos para Felgueiras porque tínhamos casa em Felgueiras e ao tempo os meus sogros estavam em Africa e previam continuar por lá. Decidimos começar a vida aqui.
RPR: Depois vieram os filhos?
Ernesto Rodrigues: Sim , dois filhos. Um rapaz [Artur Rodrigues], que nasceu primeiro. É Engenheiro de Eletrónica Industrial e licenciado também em Farmácia. E a minha filha [Rute Rodrigues] é licenciada em direito. O meu filho gere a farmácia, que é nossa, e a minha filha trabalha no contencioso da Caixa de Crédito Agrícola.
RPR: Quando entrou em Rotary os filhos já tinham nascido?
Ernesto Rodrigues: Sim, sim já tinha os dois filhos. Eles participavam em todas as iniciativas. Começaram logo. Embora depois, quando se fundou o Rotaract, não tenham entrado. Disseram: ‘por outras vias, já somos’.
RPR: Desde que foi fundado o Rotary Club de felgueiras, muito já foi feito…
Ernesto Rodrigues: Sim. Sim, muita coisa. Muita coisa. E continua a fazer. Houve tempos menos bons. Mas o saldo é positivo. Houve companheiros que entraram, estiveram no clube fizeram obra e depois saíram.
RPR: Viu passar muitos membros durante esses 37 anos.
Ernesto Rodrigues: Sim. Muitos companheiros que saíram por razões várias. E alguns ainda hoje dizem: ‘ainda somos e talvez…’.Muitos continuam a colaborar connosco quando é preciso.
RPR: Na sua opinião, o que é que faz com que alguns se mantenham nos clubes durante décadas?
Ernesto Rodrigues: Eu direi que tem a ver com o gosto que nutrimos pela causa que abraçamos e a entendemos na sua verdadeira essência. O fundamental é isto: compreender e entender a essência do que é o Movimento Rotário e nunca mais abdicamos disso. E se entendermos que é um movimento de profissionais de boa vontade, que pensam em servir através da tolerância, da amizade e do companheirismo, contribuindo para fazer o mundo melhor. Isto é fundamental.
RPR: Muitos dos que abandonam o Movimento Rotário nunca entenderam o que ele é na realidade?
Ernesto Rodrigues: Acredito que nunca entenderam. Muitos saem devido apequenas questiúnculas que não conseguem ultrapassar… É pena. Para mim, Rotary tem que ser fundamentalmente tolerância e companheirismo, sem esta pedra angular não é possível viver Rotary. É a essência, a base, a solidez do movimento. Se não formos companheiros verdadeiros como é que podemos estar ao serviço da humanidade?
RPR: É um homem beirão.
Ernesto Rodrigues: Sim. Nasci em Avô, no concelho de Oliveira do Hospital.
RPR: Que memórias traz da infância?
Ernesto Rodrigues: Muitas. Sou um beirão e um avôense, como se costuma dizer, de sete costados. Continuo a ir à minha terra, tenho lá as minhas coisas, as minhas raízes, a minha casa e tudo o que meus pais me deixaram. Ali está a minha raiz .É ali que muitas vezes vou beber para continuar. Quando vim para Felgueiras, em 1975, portanto há 42 anos, fui muito bem recebido e desde então sempre procurei intervir na comunidade felgueirense não regateando esforços para de todas as formas possíveis contribuir para o bem comum, desempenhando funções e cargos para que fui chamado.
RPR: Que cargos?
Ernesto Rodrigues: Sou presidente da Assembleia Geral da Santa Casa da Misericórdia de Felgueiras, membro da Assembleia Municipal, fui vereador da Câmara Municipal, ex-presidente da Confraria da Senhora de Pedra Maria, co-fundador e presidente do Centro Social, ex-presidente da Delegação da Ordem dos Advogados, ex-presidente da Assembleia Geral da Cooperativa Agrícola, co-fundador da CERCI-FEL e atual presidente da Assembleia Geral, Presidente da assembleia geral da Confraria do Imaculado Coração de Maria e de Santa Quitéria, presidente da Assembleia Geral da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo Terras do Ave, Basto Tâmega e Sousa , presidente do Concelho Fiscal da Sociedade de Defesa e Propaganda de Avô (uma IPSS da minha terra), presidente da Assembleia geral da Associação da Banda de Musica de Felgueiras e outras.
RPR: Como consegue tempo para tudo isso?
Ernesto Rodrigues: Se gostarmos, tudo é possível. Um mestre grego, um dia, a propósito do ter tempo, perante os seus alunos fez uma experiência: tinha um recipiente, e nele deitou pedras. O que vêm aqui? É um copo que está cheio, disseram os alunos. Está cheio? Está. Entretanto, ele pegou em areia fina e deitou por cima e ela entrou por entre as pedras. Os alunos, admirados, disseram: agora é que está cheio. E ele: está cheio? Está, agora não há dúvida, não cabe mais nada, continuaram os alunos. O mestre agarrou num copo de água e deitou no recipiente. Afinal ainda cabia mais qualquer coisa, finaliza o mestre. Bom, isto só para dizer que quando queremos há sempre tempo para contribuir e para fazer qualquer coisa por aquilo que gostamos e que, de certa maneira, nos satisfaz. E para ajudar nestas associações de carácter social e contribuir para que o mundo seja cada vez melhor, há sempre tempo.
RPR: Como surgiu a vontade para candidatar-se a Governador do Distrito 1970?
Ernesto Rodrigues: Dentro do meu clube, de vez em quando, surgia essa ideia. Foi-se adiando. Adiando porque como advogado de barra tinha que me dedicar à minha atividade porque era daí que eu vivia. E um Governador, precisava de tempo. Portanto, advogado e Governador era impensável. Entretanto, reformei-me. Fiquei com mais tempo disponível. O meu Clube entendeu que era a hora de avançar. E assim aconteceu.
RPR: Mais tarde, já em 2016, como Governador Eleito, quando estava tudo a correr bem, animado e com vários projetos para o Distrito, logo a seguir à Assembleia Distrital, chegou a notícia da doença.
Ernesto Rodrigues: Sim, nessa altura estava tudo bem. Exatamente. O impedimento da mobilidade e depois a descoberta da causa.
RPR: Como recebeu a notícia na altura?
Ernesto Rodrigues: Foi em Maio talvez. Já tinha feito a Assembleia.
RPR: Nessa altura já sentia dores?
Ernesto Rodrigues: Sim já, que me impediam a mobilidade. Mas não sabia qual a causa. Só em Maio é que descobri que as dores não eram de massagista mas tinham outra origem. Felizmente agora só preciso de algum repouso para recuperar.
RPR: Teve hospitalizado várias vezes desde essa altura.
Ernesto Rodrigues: Estive hospitalizado três vezes. Espero que agora esteja tudo bem.
RPR: Os clubes dos Distrito 1970 viram, este ano, uma diferença de abordagem por parte do Governador devido à doença. Que mensagem é que quer transmitir-lhes?
Ernesto Rodrigues: Primeiro agradecer-lhes a sua compreensão face ao meu estado de saúde e a sua disponibilidade colaborante para encontrarmos sempre, e em conjunto, a melhor solução. Foram inexcedíveis na gentileza. Ficarão sempre no meu coração. Foram verdadeiros rotários. Queria assegurar-lhes que dentro das minhas limitações tudo fiz para que o meu testemunho de rotário chegue aos companheiros. Bem hajam.
RPR: Muitas vezes com sacrifício e dores?
Ernesto Rodrigues: Muito sacrifício e dores. Mas quem é crente diz: com a ajuda de Deus e a fé dos homens tudo se consegue. E, nesse aspeto, fui fazendo possíveis os impossíveis mas não aquilo que certamente idealizei quando preparei o ano rotário. Mas “o homem põe e Deus dispõe”.
RPR: Entretanto ainda faltam alguns meses.
Ernesto Rodrigues: Agora, no tempo que resta para o termo do ano, se Deus continuar a ajudar-me, farei as VOGS que faltam, dentro do mesmo esquema – ainda não estou completamente recuperado para aguentar algumas situações -, e participarei nos eventos que se forem realizando no Distrito. Rotary cumpre-se e vive-se desde que haja boa vontade para por qualquer meio ou forma servir a humanidade. E às vezes serve-se a humanidade com pequenos óbulos.
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